A Malbec era originalmente uma uva associada ao sudoeste da França, mas hoje é muito mais gloriosa na América do Sul.” Essas são palavras da Jancis Robinson e elas não poderiam estar mais certas.
A História e Origem da Uva Malbec
Originária do sudoeste da França e com base na análise genética realizada em Montpellier, a uva malbec seria o resultado do cruzamento entre Magdeleine noire des Charentes e Prunelard. A malbec também é conhecida como Côt ou Auxerrois no sudoeste francês, mais precisamente em Cahors. A região faz vinhos tintos interessantes robustos feitos como varietal, somente uma uva (Malbec) e em cortes com no mínimo 70% de Malbec e podendo ter também Tannat e Merlot.
A origem da palavra é controversa, há quem diga que o nome seria um próprio de um camponês húngaro conhecido por Malbek, que espalhou a variedade por essa região. Outra teoria, mais lógica, já que Malbec é uma uva francesa, seria “Mal bec” ou “boca má” ou “boca amarga” em francês, devido aos taninos mais duros e robustos que os Malbecs franceses costumam ter.
Porém, ao longo do tempo o curso da história se alterou e, devido a algumas mudanças climáticas e problemas com fungos, a Malbec tem naturalmente uma grande suscetibilidade a sofrer com pragas e, por esse motivo, foi sendo deixada de lado em sua terra natal, viajando ao redor do mundo.
No final do século 19 uma praga chamada Filoxera devastou uma grande parte dos vinhedos da França. Como a Malbec é sensível para os enxertos (solução usada para continuar os vinhedos e a produção de vinhos na Europa), foi quase que deixada de lado e sua área plantada diminuiu drasticamente.
A Uva Malbec pelo mundo
Embora longe do berço, a grande Malbec, do sudoeste francês, encontrou na Argentina as condições ideais para seu crescimento.
Em meados do século 19, um grupo de fabricantes de vinhos da Argentina consultou especialistas franceses e questionou a possibilidade de levar a uva Malbec para o seu país. A finalidade, no início, era apenas utilizá-la como blend (corte) para bebidas já preparadas no país, com o objetivo de equilibrá-las e torná-las mais atraentes para o consumidor geral. Mas a uva se adaptou maravilhosamente bem e se tornou a grande uva Argentina. A uva ainda é acrescentada em cortes, mas quase sempre é a estrela principal.
A Argentina é realmente um lugar fascinante para essa uva. A Malbec precisa de dias quentes e noites bem frias, e a região de Mendoza é perfeita para essas condições. Devido sua uma amplitude térmica grande, é um lugar onde as pragas são mais fáceis de controlar.
Outro fator muito importante na Argentina, principalmente em Mendoza, são as variações de altitude. Quanto mais alto ao nível do mar, maior a complexidade do vinho produzido. Isso porque a temperatura entre o dia e a noite é fundamental para o aumento da acidez, madures dos taninos e qualidade das uvas. As altitudes dos vinhedos podem variar de 1700 a 3 mil metros acima do nível do mar. Todo dia, há variações de temperatura de mais de 20 graus entre o dia e a noite.
Todo esse terroir único fez com que essa variedade se tornasse uma das preferidas dos novos consumidores.
A Malbec e as Barricas
Outro fator importante é que a Malbec tem uma boa aceitação para as barricas que são usadas em grande escala, tanto com a Malbec francesa ou argentina. Nos vinhos franceses feitos com essa uva, a barrica se faz necessária para afinar os taninos rústicos, deixando-os mais polidos e fáceis de serem degustados quando jovens. Já nos Malbecs argentinos, os taninos quase nunca são o problema, então as barricas entram para aumentar o corpo do vinho e dar mais complexidade.
Bordeaux é a outra região em que a Malbec já foi muito importante. Ela é uma das uvas autorizadas no corte bordalês e, por conta dos problemas de cultivo, foi sendo deixada de lado na região. Embora não seja amplamente plantada ela é encontrada em algumas regiões, principalmente em Entre-Deux-Mers e sub-regiões menores.
Degustação da Malbec entre a França e a Argentina
Embora a Malbec seja plantada em muitos lugares pelo mundo, em alguns países ela tem um destaque maior. O Brasil e o Uruguai fazem alguns vinhos com Malbec, mas definitivamente não são tão empolgantes. Os melhores exemplares dessa uva, fora da Argentina e da França, são no Chile, principalmente no vale de Colchagua.
Mas o grande destaque para a Malbec é na Argentina. A Argentina faz um Malbec redondo, muito encorpado e fácil de beber. Isso deve-se muito ao clima e a altitude como já mencionamos. Por outro lado, a França faz um Malbec ou Côt muito diferente do argentino. Um vinho com taninos mais austeros e rústicos, o que faz alguns consumidores se afastarem do vinho de Cahors. Ainda assim, o Malbec de Cahors é espetacular, principalmente os mais rústicos e com alguns aninhos de garrafa.
Harmonização com Vinhos de Malbec
A uva preferida das churrascarias e, consequentemente, a uva do churrasco em casa com os amigos. A Malbec é espetacular para essa combinação, seus taninos firmes, porém polidos, ficam encantadores com a gordura e suculência da carne vermelha feita na brasa. As defumações da carne do churrasco acompanhadas com a barrica do vinho, suas notas de especiarias doces, finalizam muito bem o paladar.
Na França, é muito comum harmonizar a Malbec com um prato clássico da região, o delicioso Cassoulet. Um gizado de feijão branco com carnes gordurosas de pato, bacon, linguiças e cordeiro, que ficam perfeitos com a rusticidade do tanino da Côt/Malbec e acaba por deixar a boca limpa para a próxima garfada.
Os vinhos mais frescos, com menos barricas e maior acidez vão muito bem também com pizzas, por exemplo, principalmente os Malbecs da Patagônia e Salta, que tem uma acidez mais pronunciada e menos corpo. Já os de corpo médio, muitos deles de Mendoza, vão muito bem com massas e risotos. E se você prefere os mais encorpados e barricados, também de Mendoza, porém de melhores parcelas e maiores altitudes, procure harmonizar com pratos mais rústicos ou de preparações mais elaboradas, como os assados, que ficam marinando em vinho e tendem a ser mais saborosos e difíceis de harmonizar com vinhos de pouco corpo. Carnes de caça ficam maravilhosas com os grandes Malbecs, principalmente Javalis e cordeiro assados com batatas rústicas ou com um belo risoto de funghi. Esses também ficam especiais com os franceses, principalmente os mais encorpados.
O fato é que a uva Malbec encontrou seu apogeu na Argentina e se faz presente na França até hoje, não só como uma uva nativa, pois por lá se faz grandes vinhos com essa casta. É como uma jovem que foi estudar fora e ficou mais fina e educada.
