Se você ainda não ouviu falar desse lugar da França, não se preocupe, você não é o único. Durante muitos anos a região do Jura e seus vinhos foram esquecidos, mas atualmente, com a procura pelo consumidor por vinhos mais naturais, a pequena região voltou à cena, se destacando por seus vinhos tranquilos produzidos com as uvas locais. Vinhos, diga-se de passagem, que combinam muito com nosso clima aqui no Brasil. E que têm qualidade excepcional!
região do Jura – pequena, mas cheia de riquezas.
Jura (fala-se jurrá) é a menor região vinícola da França, localizada entre a Borgonha e a Suíça. Tem grande riqueza de solos e uma gama de vinhos mais do que especiais. Historicamente é uma região de pequenos vinhedos e viticultores. Os vinhos têm uma tipicidade forte, múltipla, graças à variedade de uva, ao manejo da videira, a forma de envelhecimento e aos diferentes terroirs.
Na região do Jura, são produzidos tintos, rosés e brancos, com uvas locais, pouquíssimo conhecidas aqui no Brasil: as tintas Trousseau e Poulsard e a branca Savagnin. Também é produzido o Crémant do Jura, espumante feito pelo mesmo método do Champagne (com segunda fermentação em garrafa). Mas o que dá a fama a região são o Vin Jaune e o Vin de Paille. Também se produz aguardente e brandy. Uma região completa!
São sete denominações de origem controlada (AOCs): Arbois, Côtes-du-Jura, Château-Chalon, L’Étoile, Marc du Jura, Macvin e Crémant du Jura.
Uma variedade única de uvas
O número de variedades utilizadas não é grande, mas as uvas são únicas: as tintas Poulsard (ou Ploussard) e Trousseau e a branca Savagnin, típicas da região. Além delas também são muito usadas as borgonhesas Chardonnay (mais plantada da região) e a Pinot Noir.
A Savagnin é uma uva branca muito antiga, usada no Jura tanto nos famosos Vin Jaune e Vin de Paille quanto nos brancos tranquilos, muitas vezes em cortes com a Chardonnay. A Poulsard é a uva tinta símbolo do Jura e praticamente não existe fora dessa região. A Trousseau (Bastardo em Portugal) é muito usada no Jura, na produção de tintos, rosés, no fortificado Macvin du Jura e até em alguns Crémant du Jura.
Os brancos do Jura costumam ser elegantes, sutis e finos, com paladar longo. As cores bem claras oferecem aromas frescos e às vezes se misturam com pitadas de frutas exóticas. Os vinhos tintos do Jura, que podem ser varietais ou de corte, costumam ter pouca coloração, acidez alta e taninos baixos. Muitos são produzidos num estilo mais fresco e leve, sem passagem por barris ou com passagem por barris antigos. São perfeitos para matar a sede (vin de soif). Outros costumam ter taninos mais presentes (Trousseau), produzindo vinhos elegantes e gastronômicos. Alguns Trousseau e Pinot Noir são envelhecidos em barris de carvalho.
Os Crémant du Jura estão autorizados a usar qualquer uma das 5 uvas, mas o mais comum são os 100% Chardonnay.
Vin de Paille – o vinho “de palha”
Um vinho naturalmente doce, resultado da desidratação das uvas (Chardonnay, Poulsard e/ou Savagnin). Essa desidratação, antigamente feita em leitos de palha (daí o nome do vinho), hoje é feita em caixas de plástico ou madeira. Os cachos são colocados para secar durante aproximadamente 6 semanas, desidratando e concentrando os açúcares e compostos aromáticos. Depois as uvas são prensadas, a fermentação é lenta e o vinho acaba com 14% a 15% de álcool. Amadurece 18 meses em barricas e só é liberado para venda após 3 anos. O Vin de Paille sempre é comercializado em garrafas de 375ml (meias garrafas). É um vinho com aromas e sabores de laranja cristalizada, ameixa, mel e caramelo. Delicioso.
Vin Jaune, o ouro da região de Jura (único e excepcional)
Apelidado de “o ouro do Jura” é realmente um tesouro perdido. O nome, traduz-se como vinho amarelo. A origem do vinho permanece misteriosa. Reza a lenda, que o Vin Jaune foi fruto do acaso: um vinicultor, descobriu uma barrica antiga na sua propriedade e ficou surpreso porque quando bebeu era um néctar dourado.
Vin Jaune é um vinho seco, feito exclusivamente com a variedade branca local, Savagnin, que tem uma ótima acidez, perfeita para o estilo desse vinho. São apenas 4 AOCS que podem produzi-lo: Arbois, Côtes du Jura, Château-Chalon e l’Etoile.
Seu processo de produção é único é o que dá a ele seus aromas típicos. O Vin Jaune passa por um processo semelhante ao Jerez (mas sem fortificação). Após a fermentação, o vinho é transferido para um barril, que não é integralmente preenchido. Desenvolve uma flor e um véu de leveduras, que demora cerca de 3 anos para se desenvolver completamente (é um vinho com características oxidativas). A partir desse momento o vinho passa a não ter mais contato com o oxigênio. Ao final de cerca de 6 anos, fica pronto. Só pode ser engarrafado 7 anos após a colheita.
O Vin Jaune tem cor brilhante e límpida, com uma linda coloração dourada. No nariz é intenso, com aromas de nozes amêndoas, frutas secas, especiarias doces e delicadas notas florais. No paladar é rico e poderoso, tem boa estrutura. Uma experiência singular para o degustador!
A garrafa Clavelin
A garrafa, assim como o vinho, também é especial. Chamada Clavelin, é a única garrafa autorizada no engarrafamento do Vin Jaune. É uma garrafa atípica, por seu formato e capacidade: 620ml. A história dessa garrafa é controvesa, mas a mais contada é que seu volume é 620ml porque um litro de vinho, durante o envelhecimento oxidativo, chegaria exatamente a esse volume.
A Clavelin recebeu seu reconhecimento oficial em 1993, após muita luta dos produtores contra a legislação europeia que previa a uniformização dos tamanhos das garrafas.
Deu para notar que os vinhos do Jura são mais que especiais! Tem um vinho para cada ocasião! Segundo Hugh Johnson, “é possível que o sommelier ofereça para toda uma refeição apenas vinhos do Jura”! E nós concordamos!
Maria Paula Almeida – Sommelière Onivino
